..."Aproveitamos, então, para descer pela beira que contorna o quarto círculo. Lá vi mais almas que em todos os círculos precedentes. Estavam organizadas em dois grupos que se enfrentavam, com os peitos nus, rolando grandes pesos em sentidos contrários até colidirem uns com os outros. Após o choque um grupo gritava “por que poupas?”. O outro gritava “por que gastas?”. Depois do choque seguiam em sentido contrário até se encontrarem novamente, do outro lado do círculo. E assim continuavam por toda a eternidade. Com o coração pungido de desgosto, perguntei: — Mestre, quem são essas pessoas? Eram padres essas almas que vejo aqui do lado, com corte de cabelos em cercilha? — Todos — respondeu o mestre —, em sua vida terrena, não foram judiciosos com seus gastos. Isto declaram, quando se encontram nas suas culpas opostas. Esses de coroa pelada são clérigos, papas e cardeais, nos quais a avareza se manifesta mais facilmente. — Mestre — falei — em um grupo como este certamente serei capaz de reconhecer alguém. — É inútil a tua esperança. — respondeu o mestre — Sua vida sem conhecimento os tornou imundos e agora é mais difícil reconhecê-los. Eternamente se enfrentarão, aqueles de punho cerrado e aqueles outros sem cabelos. Mal dar e mal guardar os tirou do mundo, colocando-os nessa rinha. Mas não vale a pena mais falar deles. Vês, filho, como de nada adianta os homens brigarem pela fortuna? Pois todo o ouro que está ou já esteve sob a Lua não comprará um minuto sequer de descanso para essas almas cansadas. — Mestre meu — disse eu — me dize o que é a Fortuna de que agora falas? Como é que ela é, essa que guarda todas as riquezas do mundo em suas mãos?"...
de A Divina Comédia - O Inferno de Dante Alighieri
2 comentários:
Parabéns pelo belo texto. Muito bom o seu blog.
Esse eu ainda (ainda! é pecado eu sei!) ainda não li! Ah! Tantos livros para devorar...ainda bem que sou gulosa, além de preguiçosa....pecadora...rsrs...
(Retorno das férias para ler-re oh criatura divina! Bjsss...)
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