Magmático tesão sem sentido a brotar em pus do corpo morto esquecido na cristaleira sob teus pés o vidro das minhas retinas resistia imperturbável como um navio que afunda num mar de gozo de pantera negra arrepios.
O caminhão da mudança chegou.
A cristaleira era da minha avó muito cuidado com ela.
Mandaste mudar o número do telefone?
Deste a nova morada aos meus inimigos?
Não te esqueças do teu amante digo nosso ao final das contas ele sustenta aos dois.
Acho que a cristaleira não vai caber na sala…
Merda o espelho rachou são sete anos de convivência para nós e para os outros toquei no verde a sorte é minha.
Penteia os cabelos antes de sair em devassa tua intimidade não leves material de limpeza não dá sorte dizem…
Onde raios terei eu metido tuas cartas?
Mau presságio virado o treze em arcano maior.
Eles não sabem do mar nem dos peixes morte morte morte ao amor.
Cheiro de peixe e casa nova a rasgar células olfactivas há crianças na casa ao lado vidraças partidas e futebol de rua condomínio fechado e porteiro electrónico.
A cristaleira não cabe ou ela ou eu ou nós a voz dos tempos ecoada na base das paredes rebentamento em teclas de um piano tilintar de cristais embalados pelo vento.
Alucinações e aves de prata cruzam o tecto em revoluções intermináveis aves rapinadoras no umbigo do mundo a sangrar o cordão umbilical a devorar a placenta ébria do útero da mãe dos nossos monstros mofados de paus e pedras nossos ossos vazios a chacoalhar em falhas sísmicas teus fantasmas e meus calmantes a tilintar no gelo dos copos das visitas.
Vamos dormir que as visitas querem ir-se embora.
Coloque os copos na cristaleira.
Vamos ninar nossas incompletudes e formas astrais desvanecer as auras escorregar na seda dos edredões e uivar dar vivas uivar…
Casa nova vida velha vida imensa e curta.
A vida dura a erecção de um pénis um pau duro um acto um facto história cíclica.
A vida é uma beata no cinzeiro de Deus. (Sobre uma cristaleira.)
PAR - PT