Jacques Derrida
15 de Julho de 1930 a 8 de Outubro de 2004
(Feliz Aniversário)
[...] O ritual (do pharmakós) era uma dessas antigas práticas
de purificação. Se uma calamidade se abatia sobre a cidade,
exprimindo a cólera de deus – fome, peste ou qualquer outra
catástrofe – o homem mais feio de todos era conduzido como
que a um sacrifício como forma de purificação e remédio para
o sofrimento da cidade. Excluindo violentamente de seu
território o representante da ameaça ou agressão exterior.
Quando uma calamidade tal como a seca ou a fome se
abatia sobre a cidade, eles sacrificavam dois desses reprovados,
como bodes expiatórios. A cerimônia do pharmakós se passa
no limite de dentro e do fora que ela tem por função traçar e
retraçar sem cessar: intramuros/extramuros.
A prática ritual, que tinha lugar em Abdera, em Thrace,
em Marselha etc. reproduzia-se todos os anos em Atenas.
E ainda no século V Aristófanes e Lísias fazem claras
alusões a isso. Platão não podia ignorá-lo. A data da
cerimônia é notável: o sexto dia das Targélias.
Angustiante e apaziguador, sagrado e maldito,
o pharmakós requer que a surpresa seja prevenida:
pela regra, pela lei, pela regularidade, pela repetição,
pela data fixa. Sócrates nasceu no sexto dia das Targélias:
o dia em que os atenienses purificam a cidade.[...]
Jacques Derrida - excerto de A Farmácia de Platão
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